sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Carta ao Supremo Tribunal Federal

Hoje acordei feliz e triste ao mesmo tempo. Feliz porque Vossa Excelência liberou o humor durante as eleições. Vamos poder rir dos tropeços dos candidatos. Em contrapartida, veio uma decisão um tanto nebulosa. Pequenos traficantes vão ter benefício da pena. Ou seja, não precisam ficar em regime fechado. Pensei, o que tem isso de Constitucional? Deixar a população refém de traficantes? Imagino que pais e mães devem ter ficado chocados. Policiais: civis, militares e federais que tentam combater o narcotráfico acabam de levar um tiro no pé. Vão prender e prender e prender a mesma pessoa diversas vezes pelo mesmo crime. É como correr atrás de bêbados nas ruas. O que seria “pequeno” traficante? Uma pedra de crack vendida todos os dias nas bocas de fumo é pequeno traficante? Droga que vicia e corrompe o futuro da sociedade? Pergunto-me que consciência jurídica tem prevalecido no país? De pedra em pedra, algumas bocas arrecadam 80 mil reais apenas num fim de semana.
Em breve, Vossa Excelência irá analisar a Lei da Ficha Limpa. Já, tão brilhantemente, julgada pelo Tribunal Superior Eleitoral. Penso que a lei é limpa, correta e simples. Nestas eleições, quem tiver condenação por júri ou renunciou ao cargo para fugir da cassação, premissa hoje altamente imoral, terá o registro de candidatura cancelado. A lei ainda aumenta a punição de inelegibilidade de três para oito anos.
Esta lei corrige anos de perversão nas eleições do país, que tornou o voto amoral. Agora, ela permite que eleitores tenham, pelo menos, melhores opções na hora de votar. A Constituição prevê que inelegibilidade será regulamentada por lei. Está aí a lei que faltava. Foram dois milhões de assinaturas para a sociedade estar tão perto de ganhar uma lição de moral de Vossa Excelência, a consciência jurídica deste país.
De fato há controvérsias. Ministro Marco Aurélio do STF, exemplar jurista, diz que a aprovação da lei é inconstitucional, gera insegurança jurídica e não pode ser retroativa e ressaltou que  numa premonição os advogados deveriam ter adivinhado: o candidato que renunciasse ao cargo seria condenado, anos depois. Peço venia ao ministro, até parabenizo pela beleza da tese. Não sou jurista e talvez entenda muito pouco de leis, mas também imagino que a insegurança política deixa milhões de brasileiros reféns de assaltantes de colarinho branco. Deixa uma sensação de frustração e de falta de exemplo do que é certo, e errado, justo e injusto, bom ou mal. Não será a toa que aqui no Brasil, jogador de futebol envolvido em escândalo com travesti ainda consiga patrocínios. Se olharmos para a moral que perdura na terra do Tio Sam temos um caso semelhante na forma e diferente no resultado. O jogador de golfe Tiger Hoods após se envolver em escândalo de adultério teria perdido grande parte da remuneração publicitária porque sua imagem era um mau exemplo. De fato, os brasileiros têm muito a avançar em matéria de moral. Mas torna-se um alento saber que os líderes políticos, que são espelho para uma sociedade, devem ser os primeiros a dar o exemplo.
Portanto, então prefiro acompanhar o voto dos ministros do STF Cármen Lúcia e  Ricardo Lewandowski e ressalto aqui parte do voto do ministro Hamilton Carvalhido do TSE:
" Não se pode negar o que seja a aplicação imediata da norma, o que seja efeito retroativo, que não é se não desconstituir hoje efeitos jurídicos constituídos no passado. Também não encontrei norma que se componha, principalmente, vida pregressa, em poucas palavras, estou convencido de que se cuida material, essencial a democracia, essencial ao estado de direito, a direção dela é o mínimo de moralidade no momento do registro de candidatura para que a gente possa ter uma regularidade na perspectiva ética. "

 
Assinado: Marina Costa - eleitora, cidadã brasileira